domingo, 20 de dezembro de 2015

MEMÓRIA – Discreto militante da ousadia

Teatro Waldemar Henrique, uma conquista da mobilização coletiva.

Para as suas circunstâncias, Gileno Müller Chaves foi ousado. Em verdade, demasiadamente ousado, considerando sua condição de servidor público, suscetível a pressões, tanto mais avassaladoras em um regime de exceção, apesar da “abertura lenta, gradual e segura” preconizada pelo então presidente Ernesto Geisel. Na esteira das relações ensejadas pela sua condição de coordenador do Parte, o Programa de Arte da Semec, ele não se furtou, por exemplo, a acompanhar, na condição de advogado, diretores e produtores culturais à Polícia Federal, nos seus embates com a censura, no empenho de evitar a mutilação dos espetáculos, no rastro dos interditos proibitórios que frequentemente careciam de nexo. Isso em uma época em que a Polícia Federal não estava a serviço de nenhuma faxina ética, como hoje ocorre, mas era um dos braços da repressão da ditadura militar, em suas diversas instâncias – federal, estadual e municipal. O que ele fazia sem cobrar um minguado honorário, obtendo, apenas, o agradecimento e respeito dos destinatários de sua comovente e corajosa solidariedade.

Nos bastidores, Gileno também participou da mobilização que resultou na criação do Teatro Experimental Waldemar Henrique, liderada por Luiz Octávio Barata (do qual foi amigo e interlocutor privilegiado) e que teve a adesão maciça da classe teatral. Com o Theatro da Paz fechado, para reformas, e sem opções para a montagem de seus espetáculos, a classe teatral mobilizou-se, contando com a adesão parcial dos músicos, pressionando Olavo Lyra Maia, o secretário de Cultura do governador Aloysio Chaves, por uma alternativa para o impasse. Com o óbvio aval de Romulo Maiorana, já então o mais poderoso empresário de comunicação do Pará e que jamais se deixou intimidar pelo estilo autocrático de Aloysio Chaves, a mobilização ganhou espaço em O Liberal, ganhando repercussão, apesar de Odacyl Catete, assessor de imprensa do governador, figurar no expediente do jornal como um dos seus diretores. A adesão ao movimento de nomes como o do cantor Walter Bandeira, cooptando sua legião de fãs, serviu para conferir popularidade à mobilização, decisiva para o governo, após negociações com a Associação Comercial do Pará, criar a nova casa de espetáculos, no prédio localizado na Praça da República, que fora o Museu Comercial e hoje abriga o Teatro Experimental Waldemar Henrique.

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